09 dezembro 2004

golpe de estado

Hoje apetece-me dar asas à minha costela conspiradora. Vai daí, aproveitando o momento político que se vive actualmente neste cantinho à beira mar plantado, desenvolvi a minha teoria acerca deste assunto: Portugal foi, ou está a ser, vítima de um golpe de estado.

Antes de prosseguir, convém desde já deixar bem claro que não sou defensor de nenhuma cor política. Num passado longínquo fui simpatizante de um partido, mas apenas isso.

Desde que sou recenseado que tenho sempre cumprido o meu direito de voto. Sejam eleições autárquicas, legislativas, presidenciais ou europeias, ou até mesmo nos referendos, até agora não falhei nenhuma. Sinto que, mais do que um direito, o acto de votar é um dever cívico pelo que, a não ser por um qualquer motivo inultrapassável, hei-de sempre exercê-lo.

A minha teoria para a actual situação política no nosso país até é simples de ser entendida. De qualquer modo, visto tratar-se de uma teoria fermentada na minha complexa mente, mais não é do que isso mesmo: uma simples teoria pessoal.

A decisão do Presidente da República (PR), o Dr. Jorge Sampaio, de dissolver o Parlamento e convocar eleições antecipadas, mais não é que a face visível de um encapuçado golpe de estado que já estava a ser preparado desde há algum tempo.

Não pondo em causa a legitimidade do PR para tomar tal iniciativa, o facto é que a atitude tomada expõe, de uma forma clara e inequívoca, a imagem de que o PR mais não é do que uma marioneta nas mãos do partido que o elegeu.

Porque é que esta decisão não foi tomada há 4 meses atrás, precisamente quando o Primeiro-Ministro (PM) da altura, o Dr. Durão Barroso, resolveu ir-se embora para a Comissão Europeia? Não teria sido muito mais lógico convocar-se eleições antecipadas do que dar posse a um político playboy como o Dr. Santana Lopes?

Acontece que, aos barões do Partido Socialista, a ideia de eleições antecipadas com o Dr. Ferro Rodrigues como candidato a PM era algo intolerável. Ferro Rodrigues sempre foi um líder a prazo, lançado para as luzes da ribalta como sucessor do Eng.º António Guterres, após a saída deste para lado nenhum, pelo simples facto de que nenhum dos reais candidatos a líderes do PS se quis chegar à frente naquela altura. Por que motivo haveriam de o fazer, quando era evidente que a derrota nas eleições era certa, como se veio a comprovar?

Perante o cenário de eleições antecipadas, e na perspectiva de duelo entre Ferro Rodrigues e Santana Lopes, os barões do PS estremeceram. Mesmo com todo o descontentamento popular para com o (des)governo da coligação, era muito pouco provável que, com Ferro Rodrigues, o PS atingisse a maioria absoluta. O PS queria, e quer, ser governo, mas sem ter que se encostar a ninguém para governar.

Perante isto, e plenamente conscientes que caso o PR optasse por dar posse a Santana Lopes, em vez de ir para eleições antecipadas, a atitude de Ferro Rodrigues seria a demissão, os barões do partido mexeram os cordelinhos para que fosse exactamente esse o desenrolar dos acontecimentos.

Dito e feito, tomada de posse de Santana Lopes igual a pedido de demissão de Ferro Rodrigues. Caminho livre para a eleição de uma liderança mediática e com uma imagem forte para agarrar os desígnios da nação.

Os desenvolvimentos seguintes não surpreendem. Era óbvio que o (des)governo de Santana Lopes estava condenado ao fracasso. A situação já não era nada favorável e algumas das mais recentes medidas, como os famigerados cortes aos benefícios fiscais ou a pseudo redução das taxas de IRS, só serviram para agravar o já de si enorme descontentamento do povo.

Convenhamos que num governo de coligação, como aquele que ainda temos, é sempre o partido mais pequeno que manda, ou seja, Portugal está na realidade a ser governado pelo Partido Popular, partido esse que teve para aí uns 6% aquando das eleições. O PP tem o PSD bem agarrado pelos tomates. “Vocês precisam de nós para governar, por isso aguentem-se à bronca”.

Não tenho quaisquer dúvidas em afirmar que, caso tivesse obtido margem para poder governar sozinho, muitas das políticas levadas a efeito pelo PSD teriam sido substancialmente diferentes. Claro que isto não significa que tudo fosse um mar de rosas e que eles não metessem a pata na poça muitas vezes.

Voltando ao PS. Eleito o seu menino bonito, o Eng.º José Sócrates, fiel discípulo do louvado ex-líder e futuro candidato presidencial António Guterres, estavam criadas as condições para efectivar o golpe.

Mexe-se um cordelinho para aqui e outros para acolá e eis que, sem que nada o fizesse prever, temos o parlamento dissolvido. É conveniente que tal aconteça numa altura em que TODAS as sondagens dão maioria absoluta ao PS.

Independentemente da insatisfação generalizada do povo, para com o actual (des)governo, o facto é que se trata de um governo legítimo, com maioria parlamentar, empossado 4 meses antes pelo PR numa lógica de estabilidade. O mesmo PR que agora demite o governo argumentando que...

Pensando bem, quais são os argumentos? Sim, verdade seja dita que até agora não houve qualquer declaração que visasse esclarecer todo este imbróglio. Efectivamente, se por um lado é fácil dar ordem de dissolução ao parlamento, por outro lado é muito complicado encontrar uma justificação credível para que tal aconteça. Neste detalhe os barões do PS deixaram Jorge Sampaio entregue a si próprio. “Desenrasca-te!”

Enquanto cidadão, confesso que estou muito preocupado com o que vai acontecer quando o PS obtiver a maioria absoluta. Não estou iludido com a imagem de renovação e modernidade que José Sócrates procura transmitir. Não tenho dúvidas que, quando ele for eleito, vai chamar para Ministros todos aqueles meninos da máquina partidária que ainda há pouco tempo lá estiveram e só fizeram asneiras.

Pensando bem, qualquer cenário resultante das eleições é preocupante. PS com maioria absoluta e voltamos aos tempos despesistas de António Guterres. PS em coligação com BE e/ou PCP é mau de mais para sequer pensar nisso. PSD com maioria absoluta é entregar o país nas mãos de um menino mimado e playboy. PSD em coligação é aquilo que hoje temos.

As perspectivas variam entre o ”muito mau”o “péssimo”... venha o Diabo e escolha!

e dei-a

30 novembro 2004

nada para fazer

Por muitos eleito como dia da preguiça, utilizado para pôr o sono em dia e ficar na ronha o tempo que se estiver acordado, os domingos são para mim precisamente o oposto. Na minha agenda dominical não se inclui qualquer ida à missa, mas o almoço em casa dos pais e a arrumação e limpeza da casa são rituais instituídos aos quais convém prestar a devida atenção.

Este domingo não foi excepção. Encerrado a questão do almoço, eis-me de volta a casa pronto para enfrentar mais um combate desigual entre o homem e a casa em que o homem trabalha e a casa brilha.

Lavar e arrumar a louça que havia sobrado da véspera, mudar a roupa da cama, pôr a máquina a lavar roupa, aspirar as divisões todas, varrer as varandas, limpar a casa de banho, lavar o chão da cozinha, pôr a roupa a secar no estendal, levar o lixo para o contentor e os matérias recicláveis para o eco-ponto. Ufa!

Não quero que pensem que tenho alguma coisa contra os seguidores da doutrina da preguiça ao domingo, nada disso. Se não sou seguidor dessa filosofia de vida é por opção e não por obrigação. Mas o caso muda de figura quando os sujeitos em questão pertencem à tribo do “nada para fazer”.

Anda por aí muito boa gente que não ter mesmo nada para fazer, ou então tem, mas visto tratarem-se de assuntos de reduzida importância, preferem ser protagonistas de situações mais consentâneas com o “nada para fazer”.

Um dos mais recentes episódios em que foi possível aferir do modus operandi destes espécimes, aconteceu a semana passada no dia em que teve início o julgamento do processo Casa Pia.

Quem tenha visto um dos espaços noticiosos que passaram nos canais de televisão nacionais, não deve ter deixado de reparar na incrível quantidade de Homo “nadaparafazer” Sapiens que se aglomerou nas imediações do Tribunal da Boa Hora.

Pessoas que passaram ali o dia inteiro só para ver todo aquele reboliço mais de perto, ou então, serem premiados com a possibilidade de insultar o seu arguido predilecto. Mas será que aquela gente toda não tinha, efectivamente, mais nada para fazer do que estar ali!?

Depois temos os incontestados líderes nacionais do ranking dos nada para fazer: a população de Canas de Senhorim. Já não aguento. Dia sim, dia não, é vê-los em manifestações, em protestos à porta do Palácio de Belém, em ajuntamentos populares para levarem a cabo cortes de estradas ou da via-férrea.

Mas será que naquela freguesia ninguém tem mais nada para fazer do que reivindicar a elevação a concelho? Será essa a contribuição daquela gente para o Produto Interno Bruto? Já estou a imaginar os slogans de boas vindas quando aquilo for concelho: “Bem-vindo a Canas de Senhorim, o concelho que reivindica!” ou “Canas de Senhorim, capital do nada para fazer.”

Esta malta irrita-me.

e dei-a

15 novembro 2004

porque será?

Todos nós já vivemos a idade dos “porquês”. É algo que é intrínseco a todos os seres humanos. Mais mês menos mês, por alturas da nossa idade pré-escolar, ou até mesmo já na fase de aluno da primária, todos já bombardeamos os adultos com pertinentes questões associadas aos “porquês”.

Hoje apetece-me regredir no tempo e voltar a essa fase da minha vida. Se for a ver bem, esse deve ter sido o período mais feliz da minha existência. Nada sabia das realidades mundanas e a minha imensa curiosidade levava-me à simples e pertinente questão do “porquê” das coisas.

Hoje os “porquês” são outros, mais consentâneos com o escalão etário e com o estado da sociedade actual, mas na sua essência, estes “porquês” possuem a mesma inocência dos “porquês” da minha infância.

Porque será que a imagem que tenho dos congressos partidários, sejam eles do(s) partido(s) do (des)governo ou dos partidos da oposição, é a imagem de um circo? Ressalvo, no entanto, uma enorme diferença entre estes circos: no circo tradicional, nós somos os espectadores a assistir ao número dos palhaços, enquanto que, no circo da política, os palhaços somos nós e quem goza à nossa custa são os que estão no poleiro.

Porque será que, independentemente de tomar a vacina da gripe ou não, a realidade é que passo 2/3 da época de Inverno com os sintomas da constipação?

Porque será que, mesmo tratando-se de um programa enjoativo, irritante, insuportável e execrável, a Quinta exerça um fascínio e uma atracção tão grandes? Ontem não contive a minha curiosidade e mudei para a TVI só para ficar a saber quem eram as duas novas celebridades(??) convidadas para este rurality show.

Porque será que tendo vontade de dizer e perguntar certas coisas a certas pessoas, a realidade é que acabo sempre por não o fazer, optando ao invés por conversas quase sempre fúteis e que em nada contribuem para eu aliviar o espírito inquieto?

Porque será que fico irritado, e acho extremamente piroso, quando vejo pais e filhos a tratarem-se por “você”, como se essa fosse a única forma que os filhos tivessem de tratar respeitosamente os progenitores?

Porque será que fico chocado ao ver a notícia acerca de um indivíduo, alcoolizado, que depois de apanhado a conduzir cerca de 40 quilómetros em contra mão na A2, foi mandado para casa pelo tribunal, com termo de identidade e residência, mas sem que lhe tenha sido retirada a carta de condução?

Entre estes e outros, a pergunta permanece... porque será?

e dei-a

03 novembro 2004

F1

De entre os vários passatempos possíveis e imaginários, aquele que, inquestionavelmente, continua a merecer a minha preferência é o sair à noite para estar em amena cavaqueira com os amigos.

Aproveitando a benesse de um fim-de-semana maiorzinho do que o habitual, tive o prazer de poder usufruir desses impagáveis momentos de boa disposição, proporcionados por conversas em círculos de amigos, com o extra de ter ocorrido em duplicado.

Essas pequenas tertúlias são únicas, mesmo que os intervenientes não mudem. Há sempre tópicos de conversa, seja a discutir o estado da sociedade actual ou os mais recentes desenvolvimentos na quinta das nulidades, seja a falar de assuntos sérios ou a rir de uma qualquer anedota.

De entre todos os sítios onde é possível ir beber um copo e pôr a conversa em dia, há um que se destaca dos demais, podendo mesmo catalogá-lo como local de culto. Publicidade à parte, até porque não estou a receber qualquer patrocínio, tem sido à mesa do Clandestino que têm jorrado as melhores conversas subordinadas à temática daquilo que eu gosto de apelidar como “ideias muito à frente”.

No mais recente desses serões, a temática debruçou-se sobre a indústria automóvel, tendo-se iniciado nos carros do dia a dia, passando por carros de sonho até se chegar à Fórmula 1 (F1).

Por entre um moscatel e umas imperiais - sendo que o habitual é estes momentos acontecerem na presença de jarros de sangria, eventualmente acompanhados por uma ou outra tosta mista ou, nas noites de maior loucura, por um chouriço flamejante - as tempestades de génio criativo foram exibidas na sua forma oral ou, como os mais cépticos preferem dizer, abriram-se as bocas para dizer alarvidades.

A F1 actual é tudo menos interessante. As corridas são monótonas e, aconteça o que acontecer, ganha sempre o mesmo, o que retira todo e qualquer interesse ao habitual espectador destes eventos. Assim, de entre as várias “ideias muito à frente” tidas com vista a uma (inquestionável) melhoria deste desporto, aqui ficam algumas (são aquelas que eu me lembro):

- sempre que um carro entrasse na box para mudar os pneus, o piloto era obrigado a colocar o triângulo de pré-sinalização, à distância regulamentar de 30 metros, devendo o mesmo ser visível a 150 metros;

- à entrada e saída da zona das boxes seriam instaladas rotundas, ornamentadas por fontes luminosas e dotadas da habitual plantação de sinais de trânsito e afins;

- nas zonas mais rápidas de cada circuito, escondido atrás de um eco-ponto, estacionavam-se carros à paisana da BT, equipados com o radar, fazendo-se parar os pilotos em infracção na chicane mais próxima para serem autuados;

- os carros deveriam ter, colados no pára-brisas em local bem visível, os selos referentes ao imposto municipal, à apólice do seguro e à inspecção periódica, sendo o piloto obrigado a ter sempre à mão os seus documentos e os da viatura;

- sempre que se efectuasse uma ultrapassagem, o piloto teria que sinalizar a mesma recorrendo aos indicadores de mudança de direcção, vulgo piscas;

- aos pilotos com costela xuning seriam permitidas algumas alterações aos carros, tais como um boom bass a bombar som por trás do piloto, a mítica luzinha de néon azul, as jantes cromadas e resplandecentes, os vidros fumados ou os pedais e alavanca da caixa em alumínio racing;

- aos pilotos com veia de camionista seria autorizada a colocação de uma chapa de matrícula, com o nome ou a alcunha do piloto, junto ao pára-brisas, bem como também seria permitido pendurar no espelho retrovisor um coração com leds a piscar;

- os religiosos poderiam sempre optar pela colocação de uma imagem de N. Sra. Fátima sobre o tabelier, pendurar um terço no espelho e colar um autocolante na traseira a dizer “Jesus Salva”;

- outros autocolantes permitidos seriam todos aqueles pertencentes à família “o meu outro carro é um Porsche”, “se estás com pressa passa por cima” ou então o clássico “bebé a bordo” se bem que no caso deste último, o piloto seria obrigado a montar a cadeirinha no banco de trás do seu bólide.

Sem dúvida que, podendo não se aumentar o interesse competitivo ao campeonato, o interesse televisivo destes eventos iria ser resmas de vezes superior ao actual.

Muito à frente.

e dei-a

19 outubro 2004

rotundas

Estão em todo o lado, crescem como cogumelos e reproduzem-se mais depressa do que coelhos. Consomem o pavimento das nossas estradas com maior voracidade do que uma praga de gafanhotos consome uma plantação de couves.

Podem ser grandes ou pequenas, podem estar ornamentadas ou apresentarem-se despidas, podem ter o lancil mais ou menos alto ou ser apenas uma circunferência pintada no chão.

Parece que a solução de todos os problemas de tráfego nas estradas nacionais passa pela construção de rotundas. Rotundas em todo o lado, em todas as estradas, numa proporção (desproporcional) de não sei quantas resmas de rotundas por cada metro de estrada.

É um flagelo. Não sei quem foi (ou foram) ou quem é (ou são) os iluminados que, um dia, descobriram esta milagrosa cura para todas as maleitas do escoamento de tráfego, mas quem quer que tenha (ou tenham) sido, falhou-lhes um pequeno detalhe: os condutores portugueses NÃO SABEM conduzir em rotundas!

Quantos de nós, possuidores de carta de condução, não passamos já pela experiência paranormal de ter que circular na rotunda do relógio, ou na rotunda do Marquês de Pombal em Lisboa, ou, levando o trânsito mais para norte, quantos já não experimentaram a alucinante sensação de ter que passar na rotunda AIP?

Muitas mais rotundas existem, todas elas problemáticas, umas mais do que outras, mas havendo em todas elas um denominador comum: o automobilista português. Grandes e muitos sustos já eu apanhei nos donuts do asfalto que por aí abundam.

Sendo isto um facto comprovado, porque é que se insiste na criação de mais dessas aberrações redondas? Como não quero que me acusem de estar a ser injusto para com os automobilistas, e como as minhas ebulições mentais estão sempre a conjurar novas teorias, julgo que a explicação deste fenómeno assenta num dos dois pressupostos que a seguir vou dissecar.

Pressuposto número um. Existem muitas rotundas porque isso convém a um lobby gigantesco, formado por entidades extremamente poderosas, como por exemplo, entre outras:

- os reboques e os bate-chapa - actuam em consórcio, são motivados pelos incontáveis acidentes e/ou pequenos toques que diariamente acontecem nas estradas de norte a sul do país, e que vêem nas rotundas uma autêntica mina de ouro, um verdadeiro íman para o negócio;

- os fabricantes de sinalética – rotunda que se preze tem, quer no seu miolo quer nos seus acessos, uma verdadeira floresta de sinais de trânsito, painéis identificativos ou, em alguns casos, até outdoors publicitários;

- a indústria farmacêutica – quando confrontados pela enésima vez com a fila de trânsito motivada por um acidente ocorrido na rotunda, são poucos os automobilistas que não têm uma crise nervos ou um ataque de mau humor, com a consequente azia ou indigestão e o (quase) inevitável recurso aos calmantes ou aos anti-ácidos;

- as gasolineiras – acidentes em rotundas provocam filas de trânsito, filas dão origem a demoras na chegada dos automobilistas ao seu destino, mais tempo os motores dos carros em funcionamento equivale a mais gasolina consumida.

Pressuposto número dois. As rotundas mais não são do que a prova da existência de vida extra-terrestre. Cada uma daquelas auréolas marca um ponto de aterragem de um disco voador, dai surgindo a imensa variedade de tamanhos que as rotundas apresentam. É exactamente a mesma lógica que está por trás daqueles misteriosos círculos que, de vez em quando, aparecem campos de cereais. A única diferença está no tipo de extra-terrestres: uns são ET’s amantes do campo, outros são ET’s urbanos.

Talvez isto explique porque é que não sabemos circular nas rotundas. Como haveríamos de saber, se as nossas escolas de condução não abordam a temática dos aliens? Seria o mesmo que, um dia, as cores dos semáforos deixassem de ser verde, amarelo e vermelho. Se fossem azul, castanho e lilás, é óbvio que também não iríamos saber o que fazer!

Eu voto no pressuposto dos ET’s... e vocês?

e dei-a

12 outubro 2004

boa acção

Nada como ter o carro avariado para fazer uma pequena viagem ao passado, recuando até aos meus dias de estudante universitário em que a utilização do comboio fazia parte da minha rotina diária.

Se algumas coisas evoluíram desde então, outras mantêm-se inalteráveis. Por um lado tenho agora carruagens modernas e mais confortáveis, horários mais preenchidos, estações mais funcionais e maior rapidez na aquisição do bilhete. Por outro lado continua a existir o bacano que se senta ao meu lado com os phones a bombar em altos berros, a senhora que insiste em pôr a conversa em dia com a parceira, dissecando em tom bastante audível a vida e os costumes de toda a vizinhança do prédio dela ou aquele pessoal que continua a insistir na utilização em doses industriais de água de colónia ou desodorizante.

Ontem ao final do dia, já suficientemente stressado e cansado com as atribulações laborais, enquanto aguardava sossegado pela chegada do comboio, sentado num banco da estação – ou apeadeiro, se preferirem – de Moscavide, estava longe de imaginar o momento “bom samaritano” que estava para acontecer.

Faltavam cerca de dez minutos para o comboio quando reparo que está um cão a passear pelos carris. Até aqui nada de especial. Não tarda muito já ele saltou dali para fora. Só que o tempo passava e o animal lá continuava, a andar dum lado para o outro com um ar assustado e desorientado.

Importa referir que nestas estações mais recentes, a altura do cais de embarque até aos carris é bastante grande, pois assim possibilita uma entrada mais fácil dos passageiros nos comboios, uma vez que as portas ficam niveladas com os ditos cais.

Este era precisamente o problema do canídeo. Ele sabia que tinha que sair dali, queria fazê-lo, só que a altura era demasiada para que ele conseguisse atingir a segurança. Para além disso, o bicho estava a meio caminho do comprimento do cais, pois se estivesse próximo de uma das extremidades facilmente conseguiria sair dali

Nos cais, de um e de outro lado da linha, várias pessoas tentavam em vão chamar pelo cão, tentando levá-lo até ao fim do cais, ou então tentando fazer com que ele se aproximasse para que alguém pudesse içá-lo. Só que tudo isto estava a deixar o bicho ainda mais assustado e desorientado.

À minha volta, com o aproximar da hora de chegada do comboio, sentia-se o crescer da ansiedade e de algum pânico nas pessoas. Murmurava-se, suspirava-se, falava-se... “... alguém que vá lá buscar o cão...”, “... alguém que faça alguma coisa...”, “... sai daí bicho, senão ficas debaixo do comboio...”

Só que o animal lá continuava e o tempo já escasseava. Ele já tinha andado uns metros na direcção do fim do cais, na direcção da segurança, mas ainda não os metros suficientes.

Foi então que eu não aguentei. Não sabia quanto tempo faltava, nem olhei para o relógio para saber. Pousei a mala do portátil e a minha bolsa, pedi ao senhor que estava sentado ao meu lado para olhar pelas minhas coisas e desatei a correr pelo cais na direcção do cão.

Quando estava perto dele saltei para os carris e tentei aproximar-me. A minha ideia era pegar nele e pô-lo em cima do cais. Só que o animal estava em pânico. Assim que sentiu a minha presença começou a fugir e não consegui pegar nele. Nessa altura, e uma vez que a distância já não era muita, comecei a correr atrás dele tentando levá-lo até à extremidade do cais. Só que ele, em vez de correr a direito, fintou-me, passando-me ao lado e começando a correr para trás.

Ele parou e eu voltei a tentar aproximar-me. Desta vez ele ficou quieto mas, assim que eu me baixei para o tentar apanhar, a reacção (natural) do animal foi rosnar-me. Falei com ele, tentei acalmá-lo e voltei à carga. Desta vez, para além das rosnadelas tive direito a uma bela dentada. Não desisti. Ele estava assustado e eu queria tirá-lo dali. Mais uma tentativa, mais uma mordidela, sendo que esta deixou-me um dedo bem marcado. Nisto ele desata outra vez a fugir na direcção do final do cais e eu a correr atrás dele, incitando-o a continuar porque a distância era pouca.

Durante os segundos ou minutos em que tudo isto se aconteceu, eu ouvia o barulho das pessoas que estavam nos cais, muito embora não estivesse a prestar qualquer atenção ao que quer que fosse que elas estivessem a dizer. Eu só pensava em tirar dali o cão. De repente, uma frase soou bem alto, acima de qualquer outra e tão perceptível como o ar que respiramos: “O comboio vem aí!”

Eu estava na mesma linha do comboio. O cão na linha ao lado a escassos metros da salvação representada pelo fim do cais. Só havia uma coisa a fazer e, na esperança de que o animal não se lembrasse de mudar de linha, saltei para cima do cais e comecei a correr em direcção aos meus pertences.

À medida que ia passando pela multidão que aguardava o comboio, fiquei estupefacto e revoltado com certas coisas que fui ouvindo. As mesmas vozes que no início se manifestaram em prol da salvação do canídeo, emitiam agora comentários do género “... não tem juízo nenhum, a saltar desta maneira para a linha...”, “... por mim bem que o cão lá ficava...” ou “... o homem deve ser maluco...”

Entrei no comboio e fui logo à janela ver onde estava o cão. Felizmente ele já estava em segurança, o que me deixou aliviado. Quando finalmente me sentei, olhei à minha volta e senti-me observado por olhares incriminadores, como se eu tivesse cometido um qualquer pecado capital. A hipocrisia e o egoísmo do bicho homem, infelizmente, não param de me surpreender. À medida que vou conhecendo as pessoas, mais gosto dos animais.

Quem diria que as boas acções deixam marcas... o meu dedo que o diga.

e dei-a

07 outubro 2004

nulidades

Não se fala de outra coisa. Para onde quer que se vá, para onde quer que se olhe, o grande tema do momento é a quinta. Aquela dúzia de celebridades alimenta o quotidiano dos portugueses, fornece temática de conversa, enche as primeiras páginas de jornais e revistas.

Podem ter baptizado aquilo de “Quinta das Celebridades” mas eu prefiro utilizar outras palavras terminadas em “ades”, tais como alarvidades, vaidades ou, a melhor de todas, nulidades. Também eu vou aproveitar a maré e vou seguir a mesma temática: nulidades.

Mas nulidades porquê? Deve ser por causa da minha aversão a este tipo de paródias. Não vou pedir desculpas por achar insultuoso para o cidadão comum, que se pague para que aquele bando de inúteis esteja para ali a fazer pouco dos comuns mortais.

Bendito país este em que um presidente de Câmara Municipal pode trocar a função para a qual o povo o elegeu pela participação neste programa, sem que seja sancionado por isso. Se fosse um qualquer comum cidadão a tomar esta opção, o mais certo era que o patrão o pusesse no olho da rua.

Mas já basta destas nulidades. Há muitas outras nulidades sobre as quais me apetece falar, a começar por mim mesmo.

Durante o recente fim-de-semana prolongado, que no meu caso se deveu à marcação de um dia de férias e não a uma tolerância de ponto, senti-me uma autêntica nulidade. Não fiz nada, rigorosamente nada, de produtivo. Limitei-me a dormir, comer, ver uns quantos DVD’s e dar de comer à minha cadela, uma vez que os meus pais não estavam em casa.

Pode parecer um contra-senso, uma vez que comer e dormir são dois dos meus passatempos predilectos, mas não gostei mesmo nada deste meu fim-de-semana. Não querendo ser mal interpretado, a realidade é que detestei aqueles quatro dias.

Felizmente para mim não fui a única nulidade do fim-de-semana. Só à conta do que vi, li e ouvi nestes dias, posso até ridicularizar umas quantas nulidades criando uma lista de potenciais vencedores do Prémio Nobel da Nulidade, baseando tal premissa nos meus (isentos) critérios de avaliação pessoais. E os candidatos são:

- Carvalho da Silva, líder da CGTP. Ouvir um dirigente sindical criticar um governo, seja de que partido for, por conceder tolerância de ponto aos funcionários públicos é aberrante incompreensível e demonstrativo de falta de coerência. Não são esses mesmos sindicatos que estão sistematicamente a ralhar, criticar e atacar os governantes, em defesa dos direitos dos sacrificados e explorados trabalhadores, exigindo (legitimamente) melhores salários, semanas de trabalho de 35 horas e maior flexibilidade perante o absentismo justificado?

- Outro candidato é aquele senhor, cujo nome não registei, que veio a público discursar acerca dos prejuízos que a concessão de tolerância de ponto acarreta no nosso PIB. Cada dia de ponte custa não sei quantos milhões de Euros ao Estado, diminuindo o PIB em não quantos por cento. Apetece-me perguntar o seguinte a esta ave agoirenta, profeta da má fortuna ou lá o que raio é que ele é: as tolerâncias de ponto não existem praticamente desde a revolução de Abril? Então só agora é que este iluminado deu conta dos prejuízos económicos de tal medida?

- Malta do street racing. Por mais argumentos que utilizem, por mais que apregoem que as transformações que fazem nos carros os tornam mais seguros, a realidade mostra o contrário. Não acredito que um carro, cuja estrutura está desenhada, concebida e idealizada, para determinadas velocidades de utilização, seja, após transformações que o tornam numa máquina capaz de atingir velocidades supersónicas, um veículo mais seguro do que quando sai da fábrica. Para além disso ouvir essa malta dizer que o Estado deveria criar espaços para eles se divertirem à vontade é ridículo. Isso tem tanta lógica como um assassino exigir ao Estado que lhe forneça as armas para poder praticar à vontade o seu passatempo.

- Rui Gomes da Silva, ministro dos Assuntos Parlamentares. As críticas proferidas por este senhor aos comentários semanais do Professor Marcelo Rebelo de Sousa, acusando-o de proferir mentiras e inverdades, e de atacar sistematicamente este (des)governo, são do mais baixo que há e mostram que estamos de volta aos tempos da censura. Só porque o Professor Marcelo é do mesmo partido que o (des)governo, não pode opinar e comentar de acordo com a realidade dos factos? Pelos vistos não, tem que ser a voz do dono. O curioso é que os comentários do homem já existiam há quatro anos e meio e, só agora, é que aquele iluminado ministro veio a público criticar a falta de pluralidade naquele debate semanal. Aquilo não é – ou melhor, era – um debate semanal, é – ou melhor, era – uma rubrica de opinião pessoal.

Por muita nulidade que eu seja, a realidade é que, dificilmente, consigo competir com nulidades tão notáveis. Mais difícil ainda será discernir qual será a nulidade mor.

Coitados dos (genuínos) animais da quinta.

e dei-a

This page is powered by Blogger. Isn't yours?